O oculto
Tão rasteiro, sempre perto do chão.
Formato estranho, pranchado,
sem protagonismo, comandado,
perdido, sem direção.
Uma borda cortada em cinco,
com as pontas duras, e a outra firme: raiz
fincada em um círculo que nunca se
fecha.
Sustenta tudo sem reconhecimento,
aguenta todo o peso quieto, despercebido,
desapercebido de adornamento.
Nem quente, nem frio, sempre morno.
Nem belo, nem feio, sempre torto.
É aquele que ninguém revela, que se
esconde
em sapatos comprometidos com a graça,
para evitar a desgraça do sol e da
chuva. Oculta-se.
Nada mais estranho do que uma mão ao rés
do chão.
No masculino é áspero, quebradiço.
No feminino, unhas vermelhas
a bulir com a fuligem das ruas...
Assim, são os pés, que nos sustentam e
nos guiam.
Mal-acabados, malditos, malvistos,
fedidos, invertidos.
Esse poeminha-descrição foi o resultado da provocação feita pela Cláudia Chigres, uma das professoras da pós de Literatura, Artes e Pensamento Contemporâneo, da PUC-Rio, para que descrevêssemos uma coisa, qualquer que fosse. O pé foi o escolhido, por estar ali, sobre a cadeira da frente, bem em frente a meu nariz. Sempre ali, despudorado em uma sandália aberta, pedindo atenção. Um exercício que me fez olhar as coisas com outros olhos.
Experimenta você também.
Experimenta você também.
Em tempo: essa foto dos meus próprios pés, relaxando em um rio de águas
límpidas e geladas, fui eu mesma que tirei. Uma delícia.
Um comentário:
Belo poema, Luciana. Compartilhei e repassei o exercício para meus alunos não enferrujarem nas férias. Já estão escrevendo.
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