sexta-feira, 12 de junho de 2015

Quando não sobra tempo para o dever de casa

Confesso que, quando criança, algumas vezes deixei de fazer os deveres de casa. Não lembro quantas vezes, mas acredito que o número tenha sido o resultado da conta entre a vergonha de chegar na escola sem eles e a preguiça de fazê-los. Mas uma coisa tenho certeza: todas as vezes que falhei em minhas obrigações de aluna, inventei uma história para não ficar tão mal assim com a professora. A mais comum era a que tinha esquecido meus deveres em casa, mas, em caso de precisar mudar a desculpa, qualquer coisa valia, assim como para o menino protagonista de No he hecho los deberes porque, de Davide Cali, editada pela espanhola Pepa Montano. Ele é inquerido pela professora porque não fez os deveres e sai desfiando uma série de desculpas esfarrapadas e mirabolantes para justificar sua falta. Desculpas absurdas como, eu "tive que ajudar o meu tio a construir uma super máquina para fazer-os-deveres-por-mim. Mas, quando ao fim acabamos, ela não funcionava". A professora ouve com a maior paciência para o deleite do pequeno leitor, que pode acompanhar, em cada uma das desculpas, uma expressiva ilustração de Benjamin Chaud, mas, ao fim, diz que não acredita no pequeno. Ele, espantado, pergunta a razão dele não acreditar nele. "Porque eu li o mesmo livro", diz a professora, mostrando o livro que estamos lendo. Confesso que torci para que o menino pudesse usufruir do benefício da dúvida sobre se sua desculpa havia colado, o que me animou em todas as vezes que precisei inventar uma lorota para a professora. Meu castigo foi ter que, anos depois, conviver com meus filhos fazendo das suas para não cumprir com os deveres de casa. Sou dura na cobrança, como a professora do menino, mas confesso que não consigo esquecer que toda, ou quase toda criança, quer mesmo é arrumar um jeito de não fazer o dever de casa. Assim, ao mesmo tempo que os puno, lá no fundo do meu coração, perdoo meus meninos, quando não lhes sobra tempo para fazer o dever de casa.

Um comentário:

Ana Paula disse...

Lorotas, desculpe esfarrapadas e mirabolantes...
Deve ser mesmo delicioso esse livro!
Beijo.