segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O que há entre o bife e a pipoca?

Foi uma decepção a leitura de Ponto de Vista, de Ana Maria Machado, para o Pedro. Li página por página com a maior calma para que ele não se perdesse no ritmo da narrativa em versos todos rimados, mas não deu certo. Ao fim de tudo perguntei o que ele tinha gostado e sua resposta foi curta: do Ziraldo. Insisti e ele repetiu a resposta. Justa escolha. Realmente o Ziraldo é o máximo e seu traço geométrico valoriza o morro e os prédios da cidade partida descrita por Ana Maria. Mas desconfiei que a resposta era de alguém que, na verdade, não tinha entendido a narrativa e mudei a pergunta. O que você entendeu do livro? A resposta veio curta e direta: "Nada." Não me espantei. Afinal, a narrativa em versos rimados, que nem sempre seguem a ordem natural das orações para fechar as rimas, confunde um leitor iniciante como o Pedro. Parei e expliquei para ele a história dos meninos que nasceram um na favela e outro no asfalto, se encontraram na praia e se tornaram amigos de toda a vida. Bonita mensagem de alguém que sofre com a cidade partida. Mas, confesso, achei um pouco ingênua. Mas me perguntei se esta ingenuidade não seria necessária para apresentar este problema a um menino, como o meu, de apenas 7 anos? Talvez. Por isso, guardei para mais tarde o conto O bife e a pipoca, do livro Tchau, de Lygia Bojunga, editado pela Casa de Lygia Bojunga, que traz a realidade nua e crua do encontro de Rodrigo, menino de classe média, e Tuca, menino de favela que estuda de bolsa na escola de bacanas. O conto é preciso no sofrimento de Tuca e de Rodrigo, que ao se aproximar um do outro entendem as diferenças entre seus dois mundos. Doído, mas real. Leitura para quando o Pedro puder suportar o tranco. Por enquanto, vamos ficando com o sonho de vencer as desigualdades com nosso esforço de não descriminar os diferentes.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Tão perto, tão longe

Não é de hoje que percebo o Pedro com o olho comprido, triste e confuso quando se depara com uma pessoa na rua pedindo dinheiro ou comida. Se for uma criança, ele fica ainda mais confuso. Ele segue em frente, mas seu olhar continua acompanhando o pedinte e tentando entender esta realidade tão dura, que faz de uma criança como ele um ser tão diferente e incompreensível. Esta situação me dá dó. Dele e do menino da rua. Os dois, cada um a seu jeito, sofrem com a desigualdade que existe em nosso país. Mas não me permito ceder à tentação de mãe de tentar poupá-lo deste sofrimento. Muita gente me pergunta se não é cedo demais para explicar a ele a pobreza e a miséria que parte de nossa população sofre. Eu acho que não. Não quero que o Pedro e o Antônio cresçam indiferentes a esta realidade. Sei que vão sofrer, mas é inevitável. Só tento evitar que eles, em sua lógica infantil, achem que dinheiro compra felicidade e todos os pobres são infelizes. Isso não é verdade. A infelicidade está na miséria. Para dar mais elementos para o Pedro entender esta complicada equação social que coloca uns lá em cima e outros lá em baixo resolvi apresentar a ele Ponto de Vista, de Ana Maria Machado, com ilustrações de Ziraldo, editado pela Melhoramentos. Eu já vinha paquerando este livro há tempos, mas achava cedo para ele entender o que até hoje eu me pergunto a razão. Agora acho que está na hora. Vou ler para o Pedro hoje à noite e depois conto como foi que ele recebeu a história do encontro de um menino da favela e de um menino do asfalto.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Bartolomeu e Roger Mello concorrem ao Alma

A literatura infanto-juvenil brasileira está novamente concorrendo ao ALMA (Astrid Lindgren Memorial Award), o maior prêmio internacional em prol da literatura para crianças e jovens do mundo, com as indicações do escritor Bartolomeu Campos de Queirós, pela segunda vez, e do ilustrador Roger Mello, que assina o São Jorge ao lado, estreando entre os concorrentes de 61 países. Na categoria promotor de leitura, Maurício Leite concorre pela terceira vez. O mundo só vai conhecer o vencedor do prêmio em 24 de março de 2010. Quem sabe a gente não repete este ano o feito de Lygia Bojunga que, em 2004, recebeu a segunda edição do prêmio pelo conjunto de sua bela obra. Um orgulho para nossa literatura que já concorreu em outros anos com as candidaturas de Ana Maria Machado e Ângela Lago.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Uma família feita de amor

Lendo hoje o comentário de uma colega no Facebook sobre a adoção de seu filho, ainda um bebê, me lembrei de um livro lindo que o Cadoca comprou em um bazar e me trouxe para eu ler para o Pedro, na época um menininho de uns quatro anos. Assim que comecei a ler Conta de novo a história da noite em que nasci, de Jamie Lee Curtis, ilustrado por Laura Cornell, editado pela Salamandra, percebi logo que se tratava de uma menina adotada perguntando aos pais sobre o encontro deles. Um encontro cheio de emoção que vai, aos poucos, mostrando ao pequeno leitor como a chegada de uma criança faz com que um casal se transforme em uma família. E, neste caso, pouco importa se ela é filha biológica ou adotada, o que importa é que ela seja desejada. Tanto é que o Pedro nem percebeu este detalhe e, como a menina, me pediu para contar de novo. A história é singela, como deveria ser, e as ilustrações dão um tom divertido ao relato da noite em que os três se encontram. Uma curiosidade é que a autora é filha dos atores Tony Curtis e Janet Leigh. Vale ler para todas as crianças, adotadas ou não, porque o que fica é o desejo dos pais de tê-las.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

A turma da vida inteira

A turma, de Helme Heine, editado pela Martins Fontes, foi o primeiro livro em que a morte aparece que não fez o Pedro chorar. Pelo contrário. Ele se divertiu muito lendo a história dos três amigos - professor Cérebro, Rose Coração e Barrigão - que nos encontram no nascimento e vão conosco até o fim. Talvez pelo livro falar muito mais da vida do que da morte. Nem mesmo a ilustração de um caixão incomodou o Pedro. Ele foi atento até o fim da história, quando morremos e os três amigos tomam rumos diferentes. O professor vai ao encontro de seus colegas falar de nós, o Barrigão não nos abandona e Rose vai distribuir corações para que não nos esqueçam. Uma bela maneira de falar do nosso fim, sem que as crianças fiquem com medo ou angustiadas. A morte como continuidade da vida e um tempo em que não seremos totalmente esquecidos. Um alento que nos dá o autor/ilustrador alemão que encantou o Pedro com seus desenhos delicados e ao mesmo tempo expressivos. Além disso, se divertiu dizendo que ele era o professor e o Antônio, nosso comilão de plantão, o Barrigão. A turma nos fez lembrar ainda do Pedro dizendo, assim que o Antônio nasceu, que o irmão não tinha cérebro. Hoje, com certeza ele tem cérebro, barriga e um enorme coração.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Dom Pedro peralta nas tintas de Massarani

Olha aí o novo livro da Mariana Massarani, Quando Pedro tinha nove anos, editado pela Global. A história é uma bela sacada da autora/ilustradora para apresentar para nossos pequenos o Rio de Janeiro sede da Côroa Portuguesa, em 1808, quando Dom Pedro, nosso futuro primeiro imperador, tinha nove anos e chegou por aqui com sua família real. Cada trinca de páginas, já que as pares abrem em duas, traz uma cena do Rio pelo traço da Massarani inspirado nas pinturas de Debret. Lindo o livro e divertida a história de um menino peralta, que passa todo o tempo sendo procurado pela família e a criadagem. Mas para desmentir a autora, que diz que fez o livro para pequenos, pensando em seu sobrinho de quatro anos, a história agrada também aos mais velhos. Meu Pedro, com 7 anos, adorou procurar o xará nas páginas do livro e de ler em voz alta, já que o tamanho do texto está de acordo com suas possibilidade de leitura. O Antônio, com 2, gostou de abrir as páginas e de ver os desenhos. E eu e minha mãe adoramos curtir Debret no maravilhoso traço da Mariana, que visitou o quarto de bebê do monarca antes de escrever a história e desenhar as ilustrações, usando naquim, pincel e aquarelas líquidas. Enfim... é um livro para ler e apreciar.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Um cão para encantar toda a família

Já vinha paquerando há algum tempo o Dorminhoco, de Michael Rosen, com ilustrações de Jonathan Langley e editado pela Brinque-Book, qual não foi minha surpresa ao vê-lo na lista da ciranda de livros da turminha do Antônio? Bela surpresa! O livro é realmente é muito legal. As ilustrações de Langley são muito bacanas e super apropriadas para a faixa etária a que se destina (de 3 a 7 anos). A história de Cão, o dorminhoco do título, passa-se em uma fazenda, com todos os animais que fazem a festa da criançada pequena: gato, porco, galinha, carneiro e vaca. O cão incomoda a todos com o seu ronco alto e nada o acorda, até que o dia chega e ele sai serelepe da vida e deixa todos seus companheiros exaustos. O cão é tão encantador, que o Antônio apesar de sua pouca idade aguentou firme, com o maior interesse, esperar pelo fim da história. Para prender a atenção dele vale tudo, mugir como vaca, roncar como o cão, miar como o gato e cocoricar como o galo. Além disso, o Cão é encantador. Tão encantador que até o Pedro, com seus 7 para 8 anos, entrou na dança para curtir a história trazida sexta-feira pelo irmão pequeno. Viva a ciranda de livros da turminha do Antônio, que agora já é aguardada até pelo Pedro.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Surpresas na noite escura

Na noite escura, do designer Bruno Munari, editado pela Cosac Naify, me chegou como um presente da professora de literatura e escritora Ninfa Parreiras, que coordena o grupo de estudos de livros infanto-juvenis da Estação das Letras, do qual faço parte, para eu ler para meu filho. Assim que cheguei em casa abri o livro para ele. Pedro sentou-se ao meu lado e se divertiu explorando página por página e cada uma das texturas de papel em que o livro foi publicado. Ele adorou a história do gato em busca de uma luzinha perdida na noite, que encontra o dia e, ao seguir uma formiga,  reencontra a noite. Pedro entendeu melhor do que eu a obra, publicada pela primeira vez na Itália, em 1956, como parte da experiência dos livros-ilegíveis, que se trata, segundo o próprio Munari,  de "livros sem palavras mas com imagens abstratas que se transformam virando as páginas, como fotogramas de um filme". Pedro se encantou com os vagalumes, que funcionam como uma saída para o absoluto da noite, e leu o livro com a imaginação. Eu talvez não tenha conseguido me desligar da minha condição de adulta, racional e excessivamente verbal para curtir mais o livro de Munari, um autor que, como as crianças, pensa com a imaginação.